Estela
**Era uma vez**, em um reino encantado, uma princesa chamada Estela. Ela era corajosa e bondosa, sempre disposta a ajudar e a desbravar os mistérios ao seu redor. Um desses mistérios era Terrivelmente, uma criatura enigmática que vivia nas sombras da floresta. Apesar de sua aura misteriosa, Terrivelmente tinha uma voz doce e encantadora, capaz de tocar os corações mais duros.
Terrivelmente e Estela começaram a se comunicar através de mensagens mágicas. Cada uma dessas mensagens era como um feitiço, repleta de palavras poéticas e profundas, que faziam Estela sonhar acordada. Com o tempo, ela sentiu que conhecia o coração de Terrivelmente, mesmo sem jamais tê-lo visto. Contudo, sempre que ela tentava se aproximar, ele erguia barreiras invisíveis, reagindo de forma assustadora e afastando-a. Estela, confusa, não sabia se Terrivelmente a temia ou se estava apenas tentando protegê-la de algo.
Certa vez, cansada de viver na incerteza, Estela decidiu confrontá-lo. Com coragem, entrou na floresta e o chamou:
— Por que nunca aparece diante de mim? Por que se esconde nas sombras?
Terrivelmente, com sua voz suave, respondeu:
— Porque temo que, ao me ver, você fuja.
Antes que Estela pudesse dizer algo mais, ele desapareceu, deixando apenas um rastro de pó de fada que se dissipou no ar.
Algum tempo depois, Estela decidiu visitar seu pai, que vivia em um pequeno vilarejo nos arredores do palácio. Durante sua jornada, enquanto montava seu gracioso unicórnio cinzento, ela cruzou com Terrivelmente duas vezes. Ele parecia hesitante, como se quisesse falar com ela, mas não tivesse coragem. Na terceira vez, finalmente tomou uma atitude.
— Estela — chamou ele, com a voz trêmula. — Venha comigo. Quero mostrar-lhe algo.
Estela, intrigada, pediu permissão ao pai e decidiu seguir Terrivelmente. Guiada por ele, ela adentrou a floresta até um lugar mágico, repleto de flores brilhantes e riachos cristalinos. Lá, ele começou a abrir seu coração, revelando seus maiores medos e inseguranças.
— Eu sempre temi que, ao ver quem eu realmente sou, você me rejeitasse — confessou Terrivelmente.
Estela, tocada por sua vulnerabilidade, também revelou seus próprios temores. Ambos perceberam que estavam presos às suas inseguranças e que isso os impedia de viver plenamente.
No entanto, quando Terrivelmente tentou se aproximar mais, algo inesperado aconteceu. Ele hesitou novamente, tomado por um constrangimento profundo. Sem saber como lidar com suas emoções, pediu que Estela fosse embora, temendo que suas falhas a magoassem.
Estela, magoada com a rejeição, começou a questionar as próprias dúvidas e medos. Ela percebeu que o que os separava não era a aparência ou a magia de Terrivelmente, mas sim o fato de ambos estarem buscando algo que parecia impossível: um amor perfeito, completo, livre de falhas e imperfeições.
— O amor — refletiu Estela — não é algo que podemos idealizar como perfeito. É a aceitação do outro, com todas as suas qualidades e imperfeições.
Com essa nova compreensão, Estela voltou à floresta para encontrar Terrivelmente. Ela o chamou e, desta vez, ele não fugiu. Tremendo, mas decidido, apareceu diante dela. Sua aparência era diferente de tudo o que ela imaginara, mas seus olhos brilhavam com a mesma doçura que havia nas mensagens mágicas.
— Não precisamos ser perfeitos para merecer amor — disse Estela, segurando a mão de Terrivelmente. — Basta sermos sinceros.
E assim, os dois começaram a construir um amor verdadeiro, não baseado na perfeição, mas na aceitação e na coragem de enfrentar seus medos juntos. O que antes parecia impossível tornou-se um conto de superação, mostrando que o amor floresce na imperfeição, desde que haja coragem, compreensão e coração aberto.
O tempo passou no reino, e a promessa de enfrentarem os medos juntos encontrou seu primeiro desafio: a distância. Terrivelmente precisou se recolher em sua própria caverna, que estava em ruínas e precisava ser pintada e reconstruída. Ele vivia entre caixas e poeira, lutando para criar um lar digno. O silêncio, às vezes, pairava sobre a floresta.
Estela, contudo, aprendeu que uma governante não espera sentada na janela da torre. Enquanto Terrivelmente cuidava de suas paredes, Estela decidiu cuidar de seu Império. Ela se recolheu em sua biblioteca mágica, consultando oráculos modernos e traçando diretrizes para um futuro distante, o ano místico de 2026.
Ela estudava as artes da Imagem e da Estratégia. Vestia-se com armaduras invisíveis de serenidade, polia suas unhas como cristais e ouvia cânticos sagrados ao amanhecer. Ela descobriu que sua vida, por si só, já era um reino vasto e fascinante.
Mas, num dia de sol a pino, enquanto se alimentava, a saudade de Terrivelmente bateu em seu peito. Não era uma saudade triste, de quem mendiga atenção. Era uma saudade nobre, de quem tem tanto ouro que deseja compartilhar.
Estela pegou um pergaminho em branco e canetas de luz.
Ela não escreveu uma carta de súplica. Ela desenhou um Mapa.
Com traços firmes, ela desenhou o futuro. Marcou a rota para as montanhas de Barbacena, onde passaria a virada do ciclo vestida de branco e calçando sapatos da cor do fogo. Marcou suas missões de curadoria real, onde cuidaria da arte de outros mestres. Desenhou a si mesma, grande e forte.
E, num canto do mapa, desenhou uma carruagem cheia de parentes, avisando que passaria perto das terras dele, mas que sua missão familiar a impedia de parar. Era um aviso elegante: "Estarei perto, mas estarei inacessível."
Antes de enviar o mapa através dos ventos mágicos, ela gravou sua voz num feitiço sonoro.
— Veja — disse ela, com a voz segura de quem sabe o que quer. — Este é o meu século. Meus planos são perfeitos. Mas sinto que falta a peça principal: você. Não sei como encaixá-lo nessa minha realidade vasta, mas o desafio está lançado.
Assim que o feitiço foi enviado, um pequeno guardião apareceu na parede do castelo: um Soldadinho, um inseto de armadura preta e branca, mensageiro da Natureza. Ele trazia o sinal de que Estela estava protegida e pronta para saltar para novos destinos.
Terrivelmente, lá de sua fortaleza em obras, recebeu o mapa e a voz. Ele parou de pintar as paredes. Ele olhou para o desenho, viu o nome dele num coração pequeno no canto da folha, e entendeu. Aquela não era mais a menina insegura da floresta. Aquela era uma Mulher que desenhava a própria vida.
Ele não tinha palavras complexas naquele momento, pois estava coberto pela poeira da reconstrução. Mas, do fundo de seu peito, ele enviou a resposta mais sincera que um guerreiro de poucas palavras poderia dar.
Ele enviou dois Corações de Rubi. ❤️❤️
E uma breve mensagem de admiração em sua língua antiga: "Que bakana".
Estela recebeu os rubis. Ela não pediu mais. Ela não exigiu textos longos.
Ela sorriu, entendeu que o amor também se manifesta na admiração silenciosa, e foi dormir.
O mapa estava entregue. O espaço ao lado dela estava desenhado.
Agora, cabia a Terrivelmente terminar sua obra e caminhar até o lugar que estava reservado para ele no Século dela.
E Estela, feliz, dormiu mais que a própria cama, certa de que seu reino estava em ordem.
Mas o destino, sempre caprichoso, reservava uma prova maior.
Anos se passaram no calendário do reino, mas apenas meses no coração de Estela. Ela continuou a construir seu império: fotos premiadas que capturavam a alma do mundo, projetos que transformavam realidades, banhos de mar que lavavam a alma, bronzes que douravam a pele como armadura de luz.
Terrivelmente, em sua caverna reformada, enfrentava tempestades inesperadas. Uma jovem de sua linhagem, ainda criança em anos mas carregando o peso do mundo, anunciou uma nova vida crescendo dentro dela. O caos irrompeu: medo, culpa, reconstrução familiar. Terrivelmente, perdido no Real de suas próprias sombras, correu para o único farol que conhecia: Estela.
Ele bateu à porta mágica com desespero. Desabafou tudo: a gravidez precoce, a culpa que o consumia, a família em frangalhos. Estela, agora rainha de si mesma, o acolheu com paciência de deusa e resiliência de guerreira. Não julgou, não surtou. Apenas ouviu, orientou com sabedoria, e disse: “Já falei demais”.
Terrivelmente saiu da conversa mais leve, até rezando em silêncio. Ele reconheceu, sem dizer, que só a paciência e a resiliência o haviam salvado — e essas virtudes tinham nome: Estela.
Os oráculos antigos, consultados em silêncio, confirmaram o chamado que ecoava desde o início: Estela fora destinada a entrar na casa dele, a ser parceira verdadeira, mas apenas se o segundo ato nascesse em estrutura, reciprocidade e presença real. Três luas foram dadas como prazo.
Estela, serena, enviou um último feitiço: um adeus com amor, um convite condicional, um abraço branco. Depois, silêncio.
Terrivelmente recebeu. Sentiu a falta como nunca. O vazio estrutural o confrontou com o que perdera: não só a paixão rara, mas a mulher que o tornava melhor.
Estela, por sua vez, continuou a brilhar. Vestiu-se de vermelho, dançou no jazz, capturou o sol em suas lentes, curou-se no sal do mar. Ela não esperava sentada na torre. Ela era o reino inteiro.
O prazo das três luas corre.
O segundo ato pode nascer — com casa, parceria, estrutura — ou morrer para sempre.
Mas Estela já sabe: com ou sem Terrivelmente, seu espetáculo continua.
Porque ela não é mais princesa.
Ela é a rainha do seu próprio século.
E assim, no reino encantado, a história segue...
com Estela no centro do palco, luzes acesas, coração aberto, mas coroada.
Fim... ou apenas o intervalo antes do grande ato final.
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E assim, no reino encantado, o intervalo se estendeu por três luas cheias, como os oráculos haviam anunciado.
Estela não esperou parada.
Ela viajou para terras distantes, onde o mar lambia os pés de montanhas antigas. Capturou imagens que faziam o coração do povo parar: crianças brincando em ruínas, flores nascendo entre concreto, o sol se despedindo em tons que ninguém ousava nomear. Cada foto era um decreto: “Eu existo além de qualquer ausência”.
Enquanto isso, Terrivelmente terminava de pintar as paredes da caverna. A cor escolhida foi um azul profundo, quase noite, porque era a única que acalmava o tumulto dentro dele. A jovem de sua linhagem deu à luz uma criança pequena e barulhenta, que chorava como se já soubesse do peso do mundo. Ele aprendeu a trocar fraldas, a cantar baixinho pra dormir, a dividir o silêncio com alguém que dependia dele. Aprendeu, enfim, que estrutura não é só parede pintada: é presença diária, escolha repetida, coragem de ficar.
Na terceira lua cheia, exatamente no dia em que o prazo se encerrava, Terrivelmente pegou o mapa que Estela havia enviado — aquele com o bonequinho dele no centro — e traçou uma linha reta até o palácio dela.
Não levou flores mágicas.
Não levou desculpas poéticas.
Levou apenas uma chave de ferro simples, recém-forjada, e um pequeno baú com ferramentas de pedreiro.
Bateu à porta do castelo ao amanhecer.
Estela abriu. Vestia branco cru, como no desenho do Réveillon que nunca compartilhara com ele. O cabelo ruivo brilhava com a luz do sol nascente. Os olhos, agora mais profundos, não tinham mais pergunta — tinham certeza.
— Eu terminei a caverna — disse Terrivelmente, voz firme pela primeira vez. — Mas ela ainda falta uma rainha.
Trouxe a chave. E trouxe mãos pra construir o que vier depois.
Estela olhou pra chave. Olhou pra ele. Olhou pro horizonte que ela mesma havia conquistado.
Sorriu — não o sorriso de princesa que espera resgate, mas o sorriso de rainha que escolhe companhia.
— A caverna é pequena — respondeu ela. — Mas meu reino é grande.
Tem espaço pra você, pra criança que chora, pra poeira que ainda vai cair.
Mas só se você entrar de verdade. Sem sombras. Sem silêncio quando apertar.
Terrivelmente estendeu a mão.
Não tremia mais.
Estela pegou a chave.
Colocou no próprio pescoço, como colar.
E, juntos, começaram a construir — não uma caverna maior, nem um castelo novo.
Construíram um lar.
Onde a princesa que já foi se tornou rainha.
Onde o Terrivelmente que se escondia se tornou simplesmente... amado.
E o reino encantado, finalmente, teve seu final feliz — não porque tudo foi perfeito, mas porque ambos escolheram ficar, dia após dia, imperfeitos e inteiros.
**Fim.**
(Agora sim.) ❤️
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